Acrílico sobre tela 70 cm x 30 cm
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Eça de Queirós
Eça de Queirós viveu algum tempo da sua vida em Évora. Seus pais viviam em Lisboa e por isso deve ter feito muitas vezes a travessia Lisboa-Barreiro e aqui apanhado o comboio para Évora. Nesta cidade alentejana foi Eça de Queirós director e pensa-se que talvez o único ou principal redactor do jornal “Distrito de Évora” pois muitas vezes escrevia com a capa de pseudónimos talvez para fazer crer que no jornal trabalhava muita gente.
É desse jornal e da pena de Eça a crónica que segue:
"Distrito de Évora" nº. 2, 10 de Janeiro de 1867
A crónica está satisfeita! E não sabem porquê?
Porque o novo ano se mostra mais razoável que o velho 1866!
É feio dizer mal dos que passaram desta a melhor vida, mas, em abono da verdade, o defunto 66 foi um ano disparatado.
Deu-nos o Inverno na Primavera, a Primavera no Verão e, por fim, o Verão no Inverno!
Mas o ano novo apresenta-se com a face carrancuda, de turvo aspecto, obrigando o oceano a visitar as nuvens, e estas por seu turno a desfazerem-se em água sobre a terra!
Ora isto pode não ser bonito, mas é racional, e a crónica é sempre pela razão.
E depois o vir o Inverno a tempos e a horas é decerto um penhor que havemos gozar no Verão belos calmeiros para saborear os sorvetes e carapinhadas da Júlia, do Alberto e Couto Braga, se assim aprouver à má economia financeira.
No dia 5, o vapor que conduzia os passageiros de Lisboa para o caminho de ferro do Sul, abriu água no trajecto e obrigou os que vinham no comboio de Évora, Beja e Setúbal, a ficar a passar a noite no Barreiro.
Por esta vez ainda felizmente este sinistro só acarreta graves inconvenientes, mas pode dar-se qualquer dia outro que produza grande número de vítimas.
Há muito que a imprensa clama contra essas carcaças que a companhia de navegação no Tejo ainda conserva em activo serviço e parece que, enquanto não tiver lugar um acontecimento que vá lançar a consternação e o luto no seio de muitas famílias, não será aquela obrigada a reformar o serviço dos vapores, visto não querer desistir do seu intolerável monopólio.
Pedimos ao governo sérias e prontas providências.
No mesmo jornal, alguns dias depois, aparece publicada a carta seguinte e a resposta do mesmo Eça de Queirós:
"Distrito de Évora", nº 4:
Sr. redactor. – No seu jornal de 10 do corrente, diz v. e a Revolução de Setembro transcreveu: «No dia 5 do corrente o vapor que conduziu os passageiros de Lisboa para o caminho-de-ferro do sul, abriu água no trajecto, e obrigou os que vinham no comboio de Évora, Beja e Setúbal a ficar e passar a noite no Barreiro.»
Posso asseverar a v. Sr. redactor, que tudo acima dito é completamente inexacto; nem o vapor fez água, nem os passageiros vindos no comboio ficaram no Barreiro. O vapor saiu nesse dia, do Barreiro para Lisboa às três horas e três quartos da tarde, e chegou a Lisboa às quatro e meia, e daqui partiu, na forma do costume, para Cacilhas a ir buscar a carreira das cinco horas para Lisboa.
Deve notar, Sr. redactor, que neste dia houve um grande temporal no Tejo, e que o vapor de África acendeu as fornalhas, fez vapor, mas não se atreveu a largar a amarração.
É para sentir que uma informação inexacta e mesmo caluniosa, desse motivo a v. fazer considerações, que nem os precedentes de vinte e oito anos, nem as vistorias passadas pelos peritos do Arsenal, ainda há três meses, autorizam.
Muito seria para desejar que a imprensa do país fosse mais cautelosa, quando se trata do crédito de terceiras pessoas, levada apenas de informações menos escrupulosas, e que muitas vezes encobrem interesses mesquinhos e desarrazoados, que se revelam, como ali, pelas palavras – intolerável monopólio, etc., etc.
Sou, Sr. redactor, com a devida consideração.
De v. etc.
António N. Sabbo Júnior
Director presidente da companhia
Esta carta recebida pede a rectificação de uma notícia, não verdadeira.
De boa vontade. Houve de facto uma má informação, sem culpa, sem mau propósito. Hoje a redacção recebeu outra carta em que o Sr. Sabbo oferece o testemunho de algumas pessoas que nesse dia desembarcaram em Lisboa.
É verdade. Um nosso redactor atravessou no vapor do Barreiro nesse dia, quando no Tejo andava temporal.
Damos toda a razão à direcção do vapor e a quem desejamos prosperidade e desenvolvimento.
No entanto nas linhas escritas não houve malevolência, ou intenção hostil: o risco dum arrombamento dum vapor, o susto que pode causar um tal boato, o que se diz da pouca segurança das máquinas, tudo levou a falar assim, mas sem intenção, e somente como quem vê um perigo, e grita com comoção para que seja evitado.
Não foi hostilidade, foi informação errada. Folgamos em que as vistorias feitas, mostrem o bom estado, a segurança, a esperança de duração, facilidade do bom serviço dos vapores do Tejo.
À redacção são perfeitamente estranhos os interesses da companhia, não os combate, não os aceita, não os sabe mesmo; se os barcos estão podres, lamenta; se os barcos estão sãos, estima; não sabe que intrigas se movem contra essa companhia, ignora absolutamente que influências queiram a sua extinção, não procura hostilizá-la, não pretende protegê-la também; são-lhe enfim, absoluta e perfeitamente indiferentes os interesses especiais da companhia: não os conhece, não os sabe: assim se vê que tudo nasceu duma informação errada.Por o que, em amor da justiça e da verdade, se rectifica a notícia no sentido da carta.